A vida nos “pregou uma peça”
20 de maio de 2020Ano 2020
3 de janeiro de 2021A pandemia veio inesperadamente, influenciando nossas rotinas, nossas famílias e claro, nossas emoções. Além das mudanças que ela provocou, também estressou ou fadigou muita gente. E é sobre isso que eu desejo falar.
Fadiga é o nome que se dá a um sintoma que está caracterizado pela sensação de desgaste, cansaço e falta de energia, sempre associado à exaustão. A fadiga gera um cansaço que aparece o tempo todo, tanto física quanto psicologicamente. Conhecemos alguns tipos de fadiga:
Fadiga física: pode denunciar uma enfermidade ou somente um cansaço pela vida agitada ou excesso de atividade física.
Fadiga emocional: cansaço extremo, falta de energia e indisposição para realizar tarefas diárias. Gerando estresse, libera o neuro hormônio cortisol e pode levar a enfermidades psicológicas e físicas. Pode levar a distúrbios psíquicos de caráter depressivo, precedido de esgotamento físico e mental intenso.
Fadiga espiritual: exaustão relacionada a onipotência ao servir. Segundo Oswald Chambers, a exaustão depende de onde você busca seu suprimento, força e poder. “Todas as minhas fontes estão em ti” Salmo 87:7
Fadiga de compaixão: tem sido descrito como o “custo do cuidado” por aqueles que estão em dor emocional (Figley 1982). O trabalho de ajuda na dor ou da relação de ajuda, requer que o profissional abra seu coração e mente para seus clientes, pacientes ou aconselhados. Infelizmente, o processo de empatia, fundamental na relação de ajuda, é o que o torna vulnerável e profundamente afetado, contribuindo para adoecer por causa do seu trabalho.
E a fadiga da pandemia, como ela tem afetado?
A OMS declarou o surto de coronavírus como pandemia em 11 de março. Desde então, passamos a fazer o que nos é pedido para fazer, passamos a ficar encurralados, isolados em nossas casas ou tendo que trabalhar com uma “guilhotina no pescoço”, afinal é uma ameaça e a qualquer momento poderíamos ser contaminados. Tivermos que fazer muitos sacrifícios. Difícil enumerar todos!
Quanto mais se estende o tempo da pandemia, do isolamento, maior a fadiga e mais risco corremos, afirma a psiquiatra Kathryn Zerbe de Portland – USA. A fadiga da pandemia faz com que não prestemos mais atenção às regras impostas para evitar o contágio, não lavando as mãos como no início, saindo mais para rua, não usando álcool em gel e máscara de proteção. Se isso está acontecendo com você, saiba que não é o único com esse comportamento.
Este é um fenômeno proveniente da fadiga de cuidado, algo que o nosso cérebro faz, quando ficamos com pouca motivação ou energia para cumprir regras de segurança, segundo Jacqueline Gollan, professora de psiquiatria da Northwestern University. Passamos a ficar impacientes com avisos e não acreditamos que é relevante ou real, não enfatizamos o risco atual. Passamos a não ter comportamento seguro, como lavar as mãos, usar máscaras e praticar o distanciamento social. Esta é uma armadilha e você precisa ficar atento ao que está fazendo.
Seis meses depois, desde que a OMS declarou estado de pandemia, o cérebro ajustou-se e não identifica mais o mesmo medo que havia meses antes. O medo foi reduzido e as defesas ficaram fatigadas. Lutar, correr ou congelar, como estratégias de defesa, retornaram para os padrões normais da vida, sem o alerta inicia; o sinal amarelo parou de acender, a vigilância ficou fatigada.
Com a resposta ao medo bem menor, nosso comportamento pode afetar aos outros. Quando a resposta ao medo para de funcionar, o perigo é maior para todos. Portanto precisamos nos lembrar que ainda estamos em meio a uma pandemia, é preciso pensar no próximo, nos outros, naqueles que podem sofrer severamente com o vírus. Para a Dra. Kerrin Begy, especialista em saúde pública na África do Sul – Universidade do Cabo, precisamos responder com solidariedade e compaixão pelo próximo.
Mesmo cansados da pandemia, precisamos de precaução, precisamos manter uma rotina como máscaras, álcool em gel, distanciamento social, lavagem das mãos. A motivação para manter? O cuidado conosco e com os outros.
Fatores estressores
O ser humano precisa de alguma previsibilidade, de rotina, e hoje não temos essa previsibilidade, vivemos com alguma imprevisibilidade, o que gera estresse. Dr Steven Taylor da Universidade de British Columbia, Vancouver- Canadá, escreveu um livro que foi publicado em outubro de 2019 sobre a psicologia das pandemias. Ele descreve os fatores estressores relacionados à pandemia:
. Incerteza sobre o perigo da imortalidade.
. Doença pessoal
. Morte de entes queridos
. Custo sócio econômico
. Ruptura com o trabalho ou escola
. Estresse que o isolamento e a quarentena trazem
. Incerteza de quem será infectado
. Incerteza de quando acabará a pandemia
. Ruptura dos rituais sociais
Similaridade do covid-19 com as pandemias anteriores e surtos epidêmicos:
. Ansiedade antecipatória
. Aumento do racismo e xenofobia
. Pânico em comprar e estocar
. Surtos hospitalares e ação de evitar ir ao hospital mesmo quando necessário
. Medo e ação de evitar profissionais da área da saúde
. Esporádicos saques e tumultos
. Aumento do altruísmo
. Rumores e teorias conspiratórias
. Rebelião contra a máscara de proteção
. Recusa da vacinação
Alertas
Há também hoje a fadiga de tela, trabalhar de modo remoto, crianças com aulas online, adolescentes, jovens e adultos, todos tendo que conviver com um celular, tablets ou computadores por longas horas… passou a ser uma rotina diária exaustiva.
A pandemia gera muito estresse em toda a população. No entanto, os que mais sofrem são: os que são intolerantes as incertezas, os que tem grau elevado de ansiedade com histórico de transtorno de humor e ansiedade, os que tem doenças pré-existentes, que podem levar ao agravamento do quadro de saúde se contraírem o vírus e os que têm elevado grau de xenofobia em geral.
A fadiga da pandemia, se dá pelo descuido, pela falta de cuidado consigo mesmo. É também uma armadilha que pode levar ao risco da segunda onda do covid-19 e novos momentos de lockdown. Na pandemia da gripe espanhola, de 1918 e 1919, a segunda onda foi pior que a primeira, levando a morte 50 milhões de pessoas no mundo. Temos a história para nos alertar. Precisamos a cuidar da nossa saúde total: física, emocional e mental, para amenizar os riscos da fadiga e própria pandemia.
IARA MONTEIRO DE CASTRO
Especialista em Terapia de Casal e Família no Chicago Center for Family Health – Universidade de Chicago. Formação em Supervisão Clínica em Terapia de Casal e Família no CCFH. Especialista em Psicologia Hospitalar – USP e CCFH. Coordenadora Geral do Instituto da Família – FTSA. Psicóloga. CRP 08/02255.
Este tema foi tratado em LIVE pelo Facebook e Youtube, quando a coordenadora foi convidada pelo Prof. Jorge H. Barro, vice-diretor da FTSA.